Como estrelas na terra (2007)

Título original: Taare Zameen Par

Título em inglês: Like stars on earth

País: Índia

Duração: 2 h e 45 min

Gêneros: Drama, família

Diretor: Aamir Khan

IMDB: http://www.imdb.com/title/tt0986264/


O colorido e cultural cinema indiano nos agracia com este filme excepcional. “Como estrelas na terra” é mais que um mero entretenimento, é uma lição de vida para todos nós. A sequência narrativa é bastante conhecida e já foi utilizada em inúmeros outros filmes ao longo da história: uma pessoa com problemas; o surgimento de um anjo da guarda que ajuda a pessoa a achar soluções; um desfecho contendo uma história de superação, com um final feliz. Soa como clichê, mas agora questiono: onde está escrito, ou quem disse, que é preciso inovar para produzir um filme apreciável? O certo é que “Como estrelas na terra” é um dos melhores filmes indianos contemporâneos. É o meu favorito, e o considero uma recomendação especialíssima.

Trata-se da história do garoto Ishaan. Uma criança inteligente, mas com sérios problemas de aprendizado – principalmente em relação à escrita e à leitura -, que, por conta disso, sofre bastante no ambiente escolar e familiar, principalmente por ter um pai muito rígido, que o compara a seu irmão mais velho, Yohaan – um dos melhores alunos da escola. Após ser enviado para um colégio interno, conhece o professor de artes chamado Nikhumb, uma pessoa iluminada que, por ironia do destino, passou pelos mesmos problemas de Ishaan na infância. Ele é a chave para a resolução dos problemas do garoto.

Temos um roteiro linear, que conta com uma estrutura não convencional de 3 atos, pois o professor Nikhumb só aparece durante o segundo ato, ou seja, durante o desenvolvimento narrativo, mas isso não causa qualquer tipo de prejuízo à fluência da história, aliás, afirmo que eventuais pequenos defeitos passam despercebidos, pela construção da história ser bastante envolvente. Esse roteiro é caracterizado, principalmente, pela simplicidade e pela capacidade de gerar emoção, algo que, diga-se de passagem, é muito comum quanto há crianças em situações difíceis. Inicialmente, apresentam-se os personagens e há uma empatia automática pelo jovem protagonista, em virtude de suas travessuras e pela percepção de que existe uma aura de rejeição sobre o garoto, devido a suas limitações intelectuais. A partir daí, o diretor “bate” em Ishaan durante mais da metade do filme, submetendo o garoto a uma série de situações delicadas, desde bullying na escola até a falta de acolhimento e cuidado de seu pai. Tudo isso para evidenciar o despreparo dos corpos docentes das instituições de ensino e a falta de sensibilidade da própria família para identificar que algo de errado acontecia com o menino. Como é peculiar de histórias indianas, a narrativa tem a capacidade de proporcionar diversos tipos de sentimentos. Após a fase do sofrimento, há a fase da esperança, de modo que podemos dividir o roteiro em duas partes completamente distintas, mas que compartilham uma mesma característica: a emoção – provocada por eventos tristes e alegres, respectivamente.

Há também alguns subtemas bastante relevantes, principalmente em relação aos fatos que sugerem o absolutismo do homem na sociedade indiana, que é patriarcalista ao extremo. Nota-se que a palavra final da família é sempre do pai de Ishaan, e essa sensação de superioridade não deixa espaço para que ele demonstre carinho pelos seus filhos, nem mesmo por Yoohan, que não dava motivos para ele se preocupar. É mostrado um controle familiar com base, muitas vezes, na violência. É o respeito conquistado pelo medo. Como contraponto à ignorância da figura paterna, é mostrada uma figura materna que funciona como porto seguro para as crianças, principalmente para Ishaan, apesar de ser impotente em relação aos atos e decisões de seu marido. Ela, que tem até uma música própria na trilha sonora, é uma das duas grandes fontes de amor da história – a segunda é o professor Nikhumb. O diretor, inicialmente, planta mudas de intolerância, irriga com amor e, através de compreensão e paciência, colhe frutos suculentos e perfeitos, que são oferecidos ao espectador num desfecho bastante tocante.

No início, ao ser mostrado o título do filme, o espectador mais atento vai notar que há um subtítulo em inglês, que deve ser considerado. As crianças são os representantes máximos da pureza do ser humano. São pequenas estrelas na Terra, que nos fazem lembrar de nossos passados, alegram o nosso presente e proporcionam um sentido maior para nossas vidas, ao olharmos para frente e pensarmos em seus futuros. Independentemente de quaisquer diferenças, “toda criança é especial”. Esse é o subtítulo, o qual é explicitamente exemplificado nos créditos finais do filme. Até durante a subida das letrinhas, há surpresas e emoções.

Não há como assistir a esse filme e não nos lembrarmos de nossos melhores professores da vida escolar. Aquelas pessoas motivadoras, que ensinavam de forma especial, com recursos diferentes do convencional, que identificavam nossas aptidões, que tinham paciência para resolver nossos problemas e tirar nossas dúvidas. Aquelas pessoas que realmente tinham o dom, a boa vontade e o amor por ensinar. Aqueles que podíamos chamar de mestre, de educador. Pessoas assim fazem toda a diferença na vida de um educando e são guardadas para o resto da vida no compartimento de boas lembranças da memória.

“Como estrelas na terra” é uma obra a que todos os professores deveriam assistir e tirar lições, sem deixar de ser um filme para toda a família. É um filme que tocará o coração de todos.

O trailer sem legendas segue abaixo.

Adriano Zumba


P.S.: Dedico esta crítica a dois educadores que marcaram minha vida escolar: Leonilda, ou simplesmente “Tia Leo”, minha professora da quarta série do ensino fundamental, na Escola Especializada Deraldo Campos, e Vicente, ou simplesmente “Vicentão”, meu professor de matemática do terceiro ano do ensino médio, no Colégio Marista de Maceió. Meus sinceros agradecimentos. Não sei se vocês ainda estão neste plano terreno, mas saibam que vocês fizeram a diferença!


7 comentários Adicione o seu

  1. Maria José Castro d'Almeida Lins disse:

    Descrito assim, não há como resistir. Parece muito bom. Famílias e educadores podem ser ‘tocados’. Vou assistir e divulgar.

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    1. Maria, entreguei esse filme na escola do meu filho, pois julgo que todo educador deveria assistir, e ele foi objeto de discussão durante a reciclagem que os professores fazem todo início de ano. Foi uma tarde de exibição e outra de debates.

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  2. SII-Free disse:

    Em uma palavra: Belíssimo. Critica bem escrita também. Obrigado pela indicação, Zumba! Sem dúvida um filme cheio de cores, poesia e música. A propósito, achei bela e apropriada a trilha sonora

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