Without air (2023)

Título original: Elfogy a levego

País(es): Hungria

Duração: 1 h e 45  min

Gênero(s): Drama

Elenco principal: Ágnes Krasznahorkai, Tunde Skovran, Soma Sándor

Diretor(a): Katalin Moldoval

IMDB: https://www.imdb.com/title/tt15495540/


Citações:

  • “Não acho que ele possa ser convencido. Ele é bastante obstinado.”
  • “- Olha, você é professora. Você é paga para ensinar valores, para definir os padrões certos. – Quais devem ser os padrões certos?”
  • “- Quanto mais alto você fala, pior fica. – Eu penso o contrário.”

Sinopse: O filme conta a história da amada professora de literatura do ensino médio, Ana Bauch (Ágnes Krasznahorkai), que inocentemente recomenda para seus alunos, visando compreender melhor Rimbaud, o filme “Eclipse de Uma Paixão” (1995) de Agnieszka Holland, conduta que ela sempre adotou ao longo dos anos enquanto professora. Um pai, então, ao descobrir que seu filho estava assistindo a esse filme, faz uma reclamação à escola transformando a vida da professora em um caos.


Sugiro esse drama húngaro dirigido e co-roteirizado pela jovem romena Katalin Moldovai, aqui em sua estreia em longa-metragens. O elenco conta com Ágnes Krasznahorkai, Tunde Skovran e Soma Sándor. O filme teve 3 prêmios no Festival Internacional de Varsóvia. O filme também foi premiado no Festival Internacional de Salônica levando o prêmio de Melhor Ator para Soma Sándor. Sua estreia se deu ao integrar a Seleção Oficial do Festival Internacional de Toronto. O filme é falado em húngaro, inglês e romeno. As locações foram na Romênia. Tem nota 7.2 no IMDB

PARA ALÉM DA PEDAGOGIA

O cinema tem se colocado como uma possibilidade de dialogar com a sociedade temas relevantes e contemporâneos. A relação que envolve o universo da escola (professores/sala de aula/alunos) teve no ano passado várias produções que problematizaram e debateram questões pertinentes nesse ambiente para além do aspecto pedagógico, sempre com um olhar crítico. Ilustram tal realidade os filmes “Ervas Secas” (Turquia), “Radical” (México), “Monster” (Japão), “Sala dos Professores” (Alemanha), entre outros. Este filme dialoga mais com o alemão “Sala dos Professores”, mas me lembrou também o filme americano de 1989, “Sociedade dos Poetas Mortos”.

Without Air” é sutil e comedidamente tece uma crítica aos ventos que sopram atualmente na Hungria, e, para isso, mostra a transformação na condução adotada por parte da escola diante da insistente pressão realizada por um pai de aluno insatisfeito com a escolha do filme indicado pela professora. A crítica é contundente, porém sua manifestação não é, contudo, explícita e aberta ao contexto político do país. Aliás, tudo no filme é apresentado de forma tangenciada. O próprio conteúdo do filme que traz à tona o real motivo do incômodo do pai, praticamente não é mencionado, não se verbaliza. É como se fosse um tema intocável, pois é um tabu para todos os envolvidos.
A diretora, que é romena, inspirou-se em uma história que realmente aconteceu com um professor romeno (notem que essa produção é rodada na Romênia, em uma escola secundária de etnia húngara) e trouxe a discussão sobre como conduzir determinados conteúdos em sala de aula para jovens secundaristas de uma escola inserida em um contexto nacional onde o atual presidente, de extrema direita, Viktor Orbán, inspirou aprovação de leis que proíbem que os professores falem com os jovens sobre sexualidade, especialmente sobre homossexualidade (tema alvo do filme e da reclamação contra a professora).

A MICROFÍSICA DO PODER

O filme é muito bem dirigido e tem uma produção muito bem feita, bem iluminada, com bastantes planos fechados, captando a tensão que o ambiente vai gerando, com lentos movimentos de câmera que se aproximam ou com enquadramentos de posições como se estivesse observando escondido, em acordo com o clima de desconfiança que toma conta da escola. Contrasta com as reações mais acaloradas dos latinos a postura da personagem principal, em ótima atuação, de uma certa impassibilidade, mesmo com toda a pressão sofrida na escola pela diretora e colegas professores, mas também advindas do quadro clínico apresentado pela mãe, e por sua relação e vida afetivas também cambaleantes. E mesmo com tudo isso, ela se mantém “inteira”. O jovem Viktor, filho do pai que fez a reclamação, está também muito bem no papel e ele personifica bem um adolescente subjugado por um pai muito rígido, tímido, mas muito profundo em seu silêncio produtor de poesia.

O poder para Michel Foucault não é apenas algo que está localizado no governo ou em seus aparelhos (ideológicos, como diria Althousser) como a polícia ou o exército. O poder também está em outras instituições em que a capilaridade deste se encontra manifesto e em exercício pleno de suas potências. São poderes não necessariamente políticos, como ele diz: “Todos nós sabemos que as universidades e todo o sistema educacional, que aparentemente deveria distribuir o saber, servem, na verdade, para manter o poder nas mãos de uma certa classe social e para excluir as demais classes sociais deste instrumento de poder”. É justamente isso que temos no filme. O uso do poder disciplinador através da perseguição de outros que se opõem ao instituído: do que a escola demanda que por sua vez reflete e se alia ao discurso oficial. A pressão político-social do grupo, que exerce poder, sutil, em todos seus segmentos (o que inclui os comitês para avaliar a questão apresentada e a punição) mostrando como restrições impostas autoritariamente servem ao controle sem ter manifestações explicitas de violência coercitiva.

ANOTHER BRICK IN THE WALL OU OS MUROS QUE SUFOCAM

Quais são os limites para e no processo pedagógico especialmente do papel do professor? Quais temas são relevantes e devem/podem ser abordados e de que maneira os fazer? A intolerância, liberdade de pensamento e expressão…O filme mostra que esses são temas imprescindíveis de se refletir, urgentemente. Para tanto, precisamos superar nossos medos e preconceitos com temas ou aspectos em debate que muitas das vezes os envolvidos desconhecem em sua essência e, por conseguinte, não deveriam poder opinar e muito menos tomar decisões que vão interferir na vida de terceiros. O filme é pedagógico nesse sentido.

Assim, se queremos seres que reflitam, que pensem e interpretem a realidade de forma crítica, não conseguiremos obter tal intento com formadores saídos do vídeo da música do Pink Floyd, “Another Brick In The Wall”. A poesia é simbólica e liberta, ao expressar e dar voz aos silenciados. Ela dá um ganho e ajuda a recuperar o fôlego daqueles que nesse contexto estão ficando “Sem Ar” (na tradução literal e simbólica do título), para assim se manterem firmes, resistindo e íntegros a seus princípios. Aliás, é uma das passagens mais belas deste filme.

O trailer com legendas em inglês segue abaixo.

Jonas André


TRAILER

1 comentário Adicione o seu

  1. iullmann disse:

    Oii, tudo bem? Não consegui fazer o Download do filme :/

    Curtir

Deixe um comentário

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.