Não estou mais aqui (2019)

Título original: Ya no estoy aqui

Título em inglês: I’m no longer here

Países: México, Estados Unidos

Duração: 1 h e 52 min

Gênero: Drama

Elenco Principal: Daniel Garcia, Xueming Angelina Chen, Sophia Metcalf

Diretor: Fernando Frias

IMDB: https://www.imdb.com/title/tt4323594/


Opinião: “Culturalmente relevante; tematicamente banal.”


Sinopse: “Ulises, líder de um grupo de dança apaixonado pela música cúmbia, é forçado a fugir do México, seu país de origem, para salvar sua vida após um mal-entendido com uma gangue local. Ele vai ilegalmente para os Estados Unidos, mas, rapidamente, deseja voltar para casa.”


O estilo musical da cúmbia tem origem na comunidade afro-colombiana do norte da Colômbia e é na verdade uma combinação de melancólicas baladas de amor e danças, que imitam rituais de acasalamento de pássaros. Em consonância com a essência do ritmo, roupas coloridas, cabelos estranhos, símbolos – como a estrela – são adaptações providas por herdeiros musicais latino-americanos, como os grupos de dança mostrados no filme. Indubitavelmente, a cúmbia é protagonista de “Não estou mais aqui“, pois, através dela, o diretor mergulha na realidade social dos “cholombianos”, que se apoderaram das referências do gênero musical, reapropriando-as através da dança, dos aspectos visuais e de laços de solidariedade muito fortes entre seus membros. Uma das temáticas preponderantes do filme, inegavelmente, é o amor pela cúmbia, pois promove um retrato autêntico de uma cultura muito específica, mas a obra abre o leque de pontos de interesse abordando temas universais como a identidade (ou a perda dela), a resiliência e as dores provocadas pelo exílio e/ou a solidão.

Além da cúmbia, o outro protagonista do filme é Ulises, um adolescente de 17 anos discretamente carismático, que assume um lugar de destaque no meio perigoso em que vive, sendo praticamente um astro da dança em sua comunidade. A beligerância da região, disputada por gangues de bandidos e traficantes, acaba levando Ulises a deixar sua terra, a se separar de suas raízes, de seus amigos e de sua família, arrancando invisivelmente uma parte da alma do jovem e impondo a adaptação a um ambiente hostil, com um idioma diferente e valores socioculturais antagônicos. Felizmente, nosso herói tem a cúmbia como amiga, que é o fator determinante de sua identidade individual. É belo quando a música toca e Ulises foge de sua realidade e dança como se estivesse em um universo só seu. Ele fica em paz, ele encontra um refúgio, apesar de toda sua filosofia de vida ter sido construída em torno da dança em grupo.

Fernando Frias tenta estruturar o enredo através de duas linhas temporais, em Monterey e em Nova York – duas temporalidades para o mesmo personagem -, que se entrelaçam e assim justificam a duração do filme de cerca de duas horas, mas é um estratégia que lhe dá pouco tempo até que o espectador perceba que há pouca ou nenhuma inovação no filme. O que é novo, na verdade, é apenas aquele contexto subcultural específico da cúmbia, que poderia ser tema de um documentário, por exemplo. De qualquer forma, o filme provê uma visão real do México e da relação que tem com os Estados Unidos. Sobre a conjuntura americana, quando Ulises se ambienta, percebe que sem conhecimento do idioma e por sua condição de estrangeiro, ele se torna culturalmente excluído – justamente algo que ele preza tanto -, o que reforça sua vonta de regressar, no entanto, entram em cena todos aqueles problemas relacionados à marginalização e à vulnerabilidade que todo imigrante ilegal vivencia na América. Nem o aparecimento da personagem Lin, que se interessa pelo protagonista e é deveras irritante, diga-se de passagem, consegue abrandar o deslocamento sentido por Ulises.

Após Ulises estar inserido em um microcosmo “alienígena” e passando por todo tipo de dificuldades, o filme reserva uma cena maravilhosa, que proporciona uma virada no enredo, quando se precebe que a vida do protagonista não poderá mais ser como antes, pois o mesmo perdeu a sua identidade. Ao cortar sua marca mais característica, seu cabelo, Ulises se despe intimamente de seus sonhos, anseios e esperanças, e  dá lugar à frustração, que seria confirmada mais à frente por sua prisão como imigrante ilegal no país em que buscou guarida, e com a conjuntura que encontrou ao regressar ao México, inclusive com a morte de um amigo.

A força do filme está baseada na profunda inspiração da realidade social, entretanto, a despeito de algumas passagens específicas, não há muitas conexões emocionais claras entre os personagens e tão pouco há objetivos encorajadores que atraiam uma atenção maior. Nota-se apenas uma história pouco apurada, que não pode ser considerada como apática e sim genuinamente comovente. A cena final acaba sintetizando muito do espírito do filme em relação a seu personagem principal e é muito relevante, mas, a grosso modo, algumas passagens especiais “salvam” o filme em um pequeno grau, pois o ritmo lento, as ações reduzidas, e as temáticas, que são, via de regra, banais, recorrentes e conhecidas, tornam a obra muito exigente para o espectador médio, mesmo que haja um esforço para promover uma apresentação paciente e dedicada de uma cultura completamente autêntica. Acho pouco para prover envolvimento necessário do público. Um documentário sobre a cúmbia talvez fosse mais oportuno. De qualquer forma, o filme é uma homenagem às culturas urbanas existentes em todo mundo, utilizando-se de um belo e caliente exemplo latino.

O trailer com legendas em português segue abaixo.

Adriano Zumba


TRAILER

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