Dara de Jasenovac (2020)

5 estrelas

Título original: Dara iz Jasenovca

Título em inglês: Dara of Jasenovac

País: Sérvia

Duração: 2h e 10 min

Gêneros: Drama, guerra

Elenco principal: Biljana Cekic, Zlatan Vidovic, Anja Stanic

Diretor: Predrag Antonijevic

IMDB: https://www.imdb.com/title/tt10554232/


Opinião: “A crueldade das separações e a força suprema do amor no mesmo contexto.”


Sinopse: “Depois da Ofensiva de Kozara liderada pelo Eixo, a maioria da população sérvia local acaba nos campos de concentração de Ustaše. Sem nenhuma informação sobre o paradeiro de seu pai, Dara, sua mãe e seus dois irmãos acabam em Jasenovac. Sua mãe e seu irmão mais velho são mortos por Ustaše. Dara torna sua missão pessoal assegurar a sobrevivência de seu irmão mais novo, Bude.”


Antes de adentrar nos meandros do filme em tela, há de haver uma contextualização histórica sobre os fatos utilizados como base. Durante a Segunda Guerra Mundial, a Croácia, segundo historiadores, era considerada como um “Estado-fantoche” da Alemanha nazista e da Itália fascista. Assim, o NDH (Estado Independente da Croácia), visando ao poder, à anexação de nações circunvizinhas, e à limpeza étnica que era um dos objetivos de Hitler, seguiu o modus operandi de seus provedores construindo campos de concentração/extermínio e aumentando a sua abrangência ao abarcar também sérvios e ciganos, alem dos judeus. Um desses campos era o de Jasenovac, onde o filme se passa. Estima-se que cerca de 700 mil pessoas foram assassinadas em solo croata durante a guerra. Tudo isso só veio chegar ao fim, apenas após a invasão soviética e a criação da Iugoslávia sob a batuta do Marechal Tito.

Sobre o filme, há uma curiosidade que deve ser salientada. Trata-se de uma história pouco conhecida do grande público. Realmente, os Balcãs são pouco citados nos livros de história quando fazem alusão à Segunda Grande Guerra. Nesse contexto, há as pessoas chamadas de “Negacionistas do Holocausto”, que resolveram se juntar para negativar o filme em tela e taxá-lo de mentiroso em nome de suas convicções. Com isso, o IMDB teve que bloquear a inserção de avaliações para “Dara de Jasenovac” em diversas oportunidades, pela campanha difamatória e organizada que foi realizada por tais pessoas. A verdade é que os registros históricos e os relatos dos sobreviventes formam uma voz uníssona que serviu como base para a construção do roteiro do filme. Finalmente, a verdade veio à tona. É impressionante como, ainda nos dias de hoje, o mal habita na cabeça de tanta gente, fazendo com que seja dispensado tanto esforço para defender o indefensável.

Dara de Jasenovac” é um filme sobre separações: entre corpo e espírito, por óbvio, pelas inúmeras e terríveis cenas de assassinatos que são exibidas – inclusive com crianças -; e de laços, pela ênfase dada às cisões, principalmente familiares, levadas a cabo pelas “ações de guerra”. O filme realmente não poupa seus espectadores, pois não se furta de personificar o mal e a desumanidade em seus personagens e tem a participação de diversas crianças no contexto. A própria protagonista, Dara, tem apenas 10 anos de idade, e o filme a acompanha desde sua ida ao campo de concentração até o desfecho, que não vou revelar para evitar spoillers. Sob os olhos da menina, as situações são apresentadas: desde os jogos mortais implementados pelos soldados para se divertirem, até momentos de esperança regados à desespero, principalmente relacionados ao destino de seu irmão de menos de 2 anos, Bude.

Varios sentimentos são representados com maestria. Em relação aos oficiais croatas, o desprezo pela vida humana e a maldade saltam aos olhos. Há um pujante regozijo na maioria dos semblantes dos personagens e uma forte sensação de superioridade e poder que está presente na conjuntura. Há, inclusive, como um simbolismo bastante pertinente para mostrar a banalidade da vida humana naquele contexto, uma relação sexual encenada em que a oficial Nada, irmã do “manda-chuva” do Campo, enquanto desfruta do prazer carnal, assiste ao genocídio que está sendo praticado naquele momento, demonstrando intensificar suas sensações como efeito da observação mortal. Os antagonistas estão realmente muito bem caracterizados. Por outro lado, os pacientes das ações dos genocidas, caracterizam a mais forte personificação da dor, regada a gotículas de esperança que utiliza como força-motriz para aflorar o amor entre as pessoas. A certeza da morte paira no ar a todo momento, e a conformação com o residual como única alternativa num contexto de perdas imensuráveis fortalece os laços e emociona sobremaneira, como na relação entre Dara e Bude – dois personagens inesquecíveis, diga-se de passagem.

Há outro simbolismo bastante oportuno que aparece algumas vezes durante a obra: o vagão dos mortos, que é o local para onde as pessoas recém-falecidas adentram e ficam juntas, como se formassem uma única família. Elas saem de uma nevasca, muitas vezes trazidas por familiares que ainda não partiram, e se acomodam em um ambiente escuro, fechado, que passa a ideia de unidade, de quantidade, para destacar sentimentos semelhantes compartilhados por elas e evidenciar o grande número de mortos. Na verdade, julgo que esse simbolismo abarca outras interpretações, mas não deixa de ser absolutamente pertinente.

Ao fim, é inegável que “Dara de Jasenovac” provê um certo alívio e uma fagulha de esperança, mas a um custo muito alto, pelo longo, perturbador e angustiante caminho que o espectador deve percorrer em suas duas horas de experiência cinematográfica. Trata-se de um filme cru e cruel, que aparentemente mostra mais do mesmo em relação a filmes similares sobre a Segunda Guerra Mundial, mas as atuações excelentes de seus interpretes, principalmente do elenco mirim, e as nuances escolhidas para serem desenvolvidas, dando ênfase a aspectos íntimos inerentes à separação entre pessoas que se amam, e que, por vezes, são forçadas a compreender as situações do alto de sua inocência, como as crianças, tornam essa obra essencial. É um filme ficcional, mas que documenta, através da sétima arte, mais uma “verdade de guerra”, que permaneceu oculta e imexível por décadas, mas que, nos dias de hoje, ainda tem gente querendo jogar para debaixo do tapete. Nota 10 para o filme por seus aspectos constituintes e por sua “função jornalística”.

O trailer com legendas em inglês segue abaixo.

Obs.: Filme indicado pela Sérvia ao Oscar de Melhor Filme Internacional em 2021.

Adriano Zumba


TRAILER

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