A ditadura perfeita (2014)

Título original: La  dictadura perfecta

Título em inglês: The perfect dictatorship

País: México

Duração: 2 h e 23 min

Gêneros: Comédia, drama

Elenco Principal: Damián Alcázar, Alfonso Herrera, Joaquín Cosio

Diretor: Luis Estrada

IMDB: https://www.imdb.com/title/tt3970854/


Citação: “Em tempos de guerra, tudo pode ser válido.”


Opinião: Adaptando Woody Allen: “Tudo o que você sempre quis saber sobre a relação entre mídia e política, mas tinha medo de perguntar.”


O ofício de fazer política é um tema sempre controverso, pois, pelo que a história vem mostrando desde sempre, há uma íntima relação com a corrupção. Da mesma forma, o ofício de comunicar para as grandes massas segue o mesmo rumo controverso, pelo poder intrínseco que carrega em sua essência, pois há uma íntima relação com a manipulação. Através dessas duas temáticas, cujas respectivas anomalias, a corrupção e a manipulação, podem se confundir em determinadas conjunturas, o filme em tela, em um tom satírico, exagerado e bastante burlesco, constrói uma narrativa reflexiva ao extremo e insta o espectador a olhar para realidade de seu próprio universo: seu município, seu estado ou seu país. Trata-se de um ótimo exemplo sobre como a sétima arte, através de sua poderosa linguagem, pode abordar assuntos polêmicos de forma leve, levando o público a uma divertida jornada, mas, ao mesmo tempo, transmitindo uma mensagem importante, pertinente e relevante. Sobre essa obra especial da cinematografia mexicana, seguem abaixo minhas impressões.

Eis a sinopse: Depois de mais uma das frequentes gafes cometidas, em rede nacional, pelo presidente dos Estados Unidos Mexicanos, o MX TV, o maior conglomerado de comunicação do país, tem que ajudar seu aliado político antes que a polêmica gere uma crise sem proporções em relação à sua sua imagem. Para isso, a televisão tenta desviar a atenção do povo exibindo, em horário nobre, um vídeo no qual o Governador Carmelo Vargas pratica corrupção. Após isso, desesperado para salvar seu futuro político, Vargas decide fechar um acordo secreto com a própria emissora que o denunciou para mudar sua imagem e torná-lo a nova estrela política do país. São encarregados para a missão Carlos Rojo – o Carlitos -, um ambicioso produtor de televisão e Ricardo Diaz, o principal repórter da emissora. No entanto, para lançar esse possível novo candidato à presidência a qualquer custo, a situação pode acabar fugindo do controle.

O filme possui um roteiro muito sagaz, que não tem vergonha de exagerar nas ações de seus personagens, em nome da potencialização de seus aspectos mais importantes, e essa estratégia consegue, ao mesmo tempo, divertir e manter sempre alto o nível de atenção de seu público, à espera de mais e mais situações com o mesmo viés. Há um fio condutor definido: transformar Vargas em Presidente da República, e todas as ramificações do roteiro, ou seja, todas as subtramas incluídas para a consecução do objetivo, bem como as que funcionam como obstáculos, são muito bem trabalhadas, desde o estopim, a cena em que Vargas recebe uma mala de dinheiro de um traficante, até as ações organizadas por Carlitos para modificar a percepção da população, através da mídia, em relação ao político corrupto, que a cada momento faz mais alguma grande besteira – algumas são imensuráveis – para dificultar a vida do produtor. A cada situação exibida, fica uma sensação de familiaridade imensa – e isso é um dos grandes atrativos da obra, pois aproxima o espectador da realidade, mesmo lançando mão de alguns supostos absurdos, que, diga-se de passagem, não deixam de parecer bastante reais.

Percebe-se claramente que o filme considera o dinheiro como a mola propulsora em seu microcosmo dramatizado, o que não difere do que observamos diuturnamente em diversos aspectos da vida, principalmente no âmbito político. Nesse contexto, com o dinheiro (público) comprando tudo o que é necessário, é exibido um verdadeiro “vale-tudo” regado a traições, reviravoltas e muita manipulação. O personagem Carmelo Vargas, espetacularmente interpretado pelo ator Damián Alcázar, personifica perfeitamente o pior que podemos observar em um ente político, pois, além de ser corrupto, é autoritário, bonachão, desonesto, ambicioso, descompromissado, desbocado, egoísta, manipulador e despreparado para o cargo, como se percebe em algumas passagens. Esse despreparo pode ser visto também no atual Presidente do México logo no início, o que fisga o espectador logo nos primeiros minutos, que são absolutamente hilários. É importante destacar que, na maioria do tempo, uma trilha sonora jocosa contribui muito para a construção da aura burlesca que o filme apresenta. É rir para não chorar!

De modo simultâneo, os personagens da TV demonstram a todo o tempo, através de uma série de ações, como o mundo midiático pode ser sujo, mentiroso, ganancioso, e, principalmente, manipulador. Nesse sentido, o filme trabalha duas vertentes: a busca desenfreada pela audiência e a grande e incessante cobiça por dinheiro, as quais são desenvolvidas no sentido de flertar com o despautério, mas, assim como no âmbito político, exalam realidade. É interessante conhecer a “Operação Caixa Chinesa”, que é utilizada para levar ao esquecimento determinado assunto potencialmente destrutivo para uma pessoa pública, ao dar grande destaque a algo que gere comoção incondicional ou mesmo seja tão escandaloso quanto o fato que se deseja encobrir, e obtenha o máximo da atenção da população. Com a exteriorização da atuação da TV fictícia, principalmente pela apresentação de seus bastidores, mas, também, de seu produto final: um famoso programa de notícias, é automático o sentimento por parte do espectador, que pode ser induzido com frequência pela mídia, principalmente pela parcialidade com a qual alguns veículos de comunicação tratam determinado assunto, principalmente as notícias relacionadas ao aspecto político. Não é raro observarmos a mesma notícia ser mostrada de formas diferentes nos mais diversos mecanismos de imprensa, e isso tem o grande poder de influenciar o julgamento das pessoas sobre determinado fato.

A ditadura perfeita” é uma obra fácil de assistir, pois transita pela tragicomédia na maioria do seu tempo, no entanto, a mesma facilidade pode ser atribuída ao afloramento de sensações estranhas em seus espectadores: de que são manipulados todos os dias pela mídia e por políticos inescrupulosos. Ao fim, nota-se que, nas sombras, quem dá as cartas é o capital, a verdade é apenas algo relativo e as pessoas, infelizmente, têm cara e corpo de fantoche, basta existir uma mão poderosa que as controle.

O trailer segue abaixo.

Adriano Zumba


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